“Roda Gigante”
Quem me conhece sabe que eu amo os filmes do Woody Allen. Sou daqueles fãs que compram box de DVDs, leem qualquer notícia sobre as novas produções e esperam fielmente pelo longa anual que o diretor e roteirista sempre lança. Posso enumerar aqueles que mais gosto, como “Manhatan” (1979), “Match Point: Ponto Final” (2005), “Vicky Cristina Barcelona” (2008) e “Meia-Noite em Paris” (2011). Tem os clássicos que não podem ficar de fora: “Noivo Neurótico, Noiva Nervosa” (1977), “Zelig”, (1983), “A Rosa Púrpura do Cairo” (1985), “A Era do Rádio” (1987) e “Tudo o que Você Sempre Quis Saber Sobre Sexo mas Tinha Medo de Perguntar” (1972); e aqueles últimos, que foram arrebatadores e que ganharam meu coração: “Tudo Pode Dar Certo” (2009), “Blue Jasmine” (2013) e até o do ano passado, “Café Society”, entraram pra minha lista.
Mas essa programação certinha de um filme por ano é arriscada, pois a gente sempre espera um filmaço do diretor, e ele nem sempre vem. Foi assim com alguns derradeiros, como “O Sonho de Cassandra” (2007), “Você Vai Conhecer o Homem dos Seus Sonhos” (2010) e “Para Roma com Amor” (2012). Não posso dizer que eu não gostei deles. Isso não seria verdade. Quando você curte o estilo do diretor, já era: você se enxerga nele, busca suas referências, suas manias, sua forma de fazer cinema que tanto te encanta. São aquelas musiquinhas anos 20 adoráveis, um jazz perfeito como a melhor e constante trilha sonora; os ótimos e intermináveis diálogos; a presença frequente da narração, uma intensa conversa com o espectador; os cenários encantadores pelas ruas de Nova York e, mais recentemente, pelas europeias; as muitas referências literárias; a personagem feminina marcante, muito bem desenhada por suas musas do cinema; e, é claro, aquele protagonista melodramático, rabugento, hipersensível e neurótico, que eu amo – seja ele alter ego do cineasta ou não.
Pronto, cheguei ao ponto que eu queria chegar, pois estou descrevendo justamente “Roda Gigante”, filme que está em cartaz nos cinemas. No longa que se passa em Coney Island, praia localizada no bairro do Brooklyn, em Nova York, a atriz fracassada e agora garçonete Ginny (Kate Winslet) é casada com o operador de carrossel Humpty (James Belushi) e cuida do problemático filho do primeiro casamento. Ela acaba se apaixonando pelo salva-vidas Mickey (Justin Timberlake), o narrador da história, e sua vida começa a ter mais sentido. Mas quando sua enteada, Carolina (Juno Temple), também cai de amores pelo bonitão, as duas começam uma forte concorrência, e a neurose vira papel principal. Você já pode imaginar que a ranzinza e entediada da história é a personagem de Kate Winslet, mas o que você não imagina é o tanto que ela dá um show de interpretação em cena.
Sob a belíssima e precisa fotografia de Vittorio Storaro, que trabalhou com Allen em “Café Society” e traz um abundante jogo de luzes à produção, a atriz, que já levou o Oscar por “O Leitor”, se veste completamente da aborrecida e obstinada personagem e pode se juntar às cinco atrizes (Diane Keaton, Dianne Wiest, Mira Sorvino, Penélope Cruz e Cate Blanchett) que já conquistaram a estatueta pelo trabalho em filmes de Allen. Seria lindo se Kate fosse pelo menos indicada, pois ela é a melhor atração do longa. Em seus altos e baixos, como uma roda-gigante, Kate brilha, literalmente, com o privilégio de monólogos muito bem enquadrados pela luz boa de Storaro e por planos-sequência que a deixam em mais evidência. No final, você se diverte e sofre muito com suas intensidades, e vê perfeitamente o melancólico e birrento Woody Allen por ali.
O roteiro também é ótimo, bem amarrado, e você acaba se divertindo com os tons de humor que Allen dá entre o taciturno rumo conclusivo da personagem. Entre o idealismo e a realidade, entre os sonhos e pesadelos de cada personagem, o diretor dá aquela boa pincelada numa trama carregada de traição e paixão ardente de verão. Definitivamente, não é o melhor filme dele, não. Mas é uma respeitável roda-gigante de emoção.
Até semana que vem!
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