A dance music explodia nos cinemas na televisão, com Sônia Braga rebolando na novela “Dancin Days” ao som de “As Frenéticas”. Na música, a MPB vivia um de seus melhores momentos, reforçada pelo Clube da Esquina. No Cine Jacques, o garoto Renato Diniz Silveira via várias sessões seguidas, pagando apenas um ingresso, enquanto a mãe de seu colega fazia compras na loja de departamentos Mesbla, uma das referências do centro da cidade.
Pelo olhar de quem passou a infância e a adolescência numa mesa de cirurgia, devido às sequelas da poliomielite, surge no livro “Dias Demais” (Adelante Editora), que será lançado no dia 3 de setembro, a partir das 11 horas, no Vila 211, Rua Professor Estêvão Pinto, 211 – Serra o retrato nostálgico de uma Belo Horizonte das décadas de 70 e 80 e que acompanha os principais movimentos culturais dessa época. Uma história efervescente que ganha tons divertidos e emocionantes na escrita do autor.
O bom humor é uma das características principais da obra de estreia de Silveira, com cada acontecimento sendo pormenorizado pelo olhar arguto de uma criança curiosa, teimosa e divertida. “As coisas, às vezes, eram bizarras demais. A realidade do que aconteceu tem uma dimensão ficcional muito maior do que eu poderia imaginar. São muitas histórias importantes e loucas num período muito pequeno de tempo”.
Com uma mãe que parece ter saído de um dos filmes de Pedro Almodóvar, capaz de passar batom para enfrentar uma fila no posto de saúde, o hoje professor e psiquiatra passou por toda sorte de curandeiros, como ser colocado nos intestinos ainda aquecidos de um boi recentemente abatido, sempre com desenlaces hilários. Um deles quase virou um episódio da peça “Pequenos Milagres“, do Grupo Galpão, quando visitou o túmulo do padre milagreiro Ermelindo, em São José do Goiabal.
Romeiros afirmavam que a água que saía da sepultura tinha o poder sagrado de curar qualquer doença. O relato deste momento traz a fragilidade de uma família buscando por um milagre que traria alento para toda uma vida de luta por recuperação física, sem muitos resultados até então. O que se passa por lá ganha contornos inimagináveis, nos conduzindo a uma grande reflexão sobre as consequências que algumas ações dos adultos têm sobre as crianças.
“Dias Demais” não foi concebido como uma história de superação ao estilo “Forrest Gump”, em que arrancaria os aparelhos das pernas numa corrida e transformaria o mundo, mas como ponto de partida uma auto-investigação: como explicar para a amiga as razões de um psiquiatra ter medo de anestesia? A pergunta surge em 2008, quando sofreu uma queda dentro de casa, “Foi um tombo horroroso. Quebrei o fêmur em três lugares e tive que ir para o bloco cirúrgico – a última vez que tinha estado lá foi aos 16 anos. Foi aí que eu me deparei com o meu medo infantil novamente, mesmo sendo médico”, diverte-se. Os médicos achavam que ele estava brincando quando se exasperava, dizendo estar com medo de morrer com a anestesia. “Estava completamente em pânico”, recorda.
À pergunta que o levou para uma viagem ao passado nasce de “um exercício autorreflexivo sobre estar no mundo”, como Silveira define o livro. Apesar de contar histórias envolvendo uma criança com paralisia infantil, ele acompanha, na verdade, o nascimento de um sujeito. “Aquele da psicanálise, que sabe desejar e constrói a partir disso. Mas não é, como nas histórias de superação, para eu chegar ao final e dizer: venci! O mais difícil foi fazer caber na cabeça de um menino tanta novidade”.
O AUTOR – Renato Diniz Silveira O AUTOR – Renato Diniz Silveira é médico psiquiatra, preceptor da residência em Psiquiatria da FHEMIG, doutor em Educação pela UFMG e mestre em Psicologia Social pela mesma universidade. É um dos fundadores do curso de Medicina da PUC-MG, onde é um professor, ministrando as disciplinas de Psiquiatria e Saúde Mental.
Lançamento do livro “Dias Demais” com Renato Diniz Silveira. Livro será comercializado no valor 50 reais. É no dia 3 de setembro na Vila 211 – Rua Professor Estêvão Pinto, 211 – Serra. 11 horas
Um beijo
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