“Manchester à Beira-Mar”
Esse é o mote do filme indicado em seis categorias do Oscar 2017, incluindo, Melhor Filme.
Não há muito o que fazer. O que foi feito já mudou a história. E o que mudou a história mudou até mesmo sua essência. Imagine você passar por algo tão forte que pudesse transformar sua vida por inteiro, por completo, para sempre. Algo duro, intenso, pesado, de que você não tivesse culpa alguma, talvez… mas que, talvez também, unicamente por sua grande culpa, sua vida não fosse – nunca mais – a mesma. Esse é o mote do filme “Manchester à Beira-Mar”. Esse também é o áspero e oneroso sentimento que é transmitido ao espectador desde as suas primeiras cenas até o fim da sensível e excelente produção do diretor e roteirista Kenneth Lonergan.
Quando você começa a ver o filme, você vê um protagonista durão, introspectivo, completamente antissocial, de uma brutalidade tão forte que você só consegue imaginar o que ele é naquele momento – não consegue visualizar tudo que ele passou para, então, se tornar aquela casca toda. Mas, com o ritmo da história, você vai descobrindo que a rasteira que ele tomou da vida é a resposta mais natural para toda aquela impetuosidade. Uma forma de dizer violentamente ao universo que “já deu, eu não preciso suportar mais nada sorrindo porque o que aconteceu comigo foi completamente irreversível!”.
Na história, Lee Chandler (Casey Affleck, ganhador do prêmio de Melhor Ator no Globo de Ouro deste ano) é forçado a retornar para sua cidade natal com o objetivo de tomar conta de seu sobrinho adolescente, após o pai do jovem, Joe (Kyle Chandler), seu irmão, falecer precocemente. Só que esse retorno é bem mais complicado e sofrido porque Lee precisa enfrentar as razões que o fizeram ir embora e deixar sua família para trás, anos antes.
É esse o ponto crucial e imutável. Ao saber o que houve com Lee, você o entende e quer abraçá-lo por isso (e você sabe e não precisa se preocupar: não sou de dar spoilers, apenas digo que o choque é profundo e inalterável!). E é dentro dessa profundidade que o brilhante roteiro te envolve e, quando vê, você já está entregue àquela produção: um drama sobre perdas comovente – que chega até a ter momentos de ternura e de humor – e que, incrivelmente, te faz sair do cinema se sentindo um pouco mais vivo por causa da tragédia a que acabou de assistir.
Casey Affleck está ali justamente pra deixar tudo mais sombrio. Esse é simplesmente o papel da vida do irmão mais novo de Ben Affleck. Outra que aparece pouco, mas, no pouco que aparece, traz a fatalidade estampada na pele, é Michelle Williams, a ex-mulher de Lee. Duas peças-chave de um filme que te faz pensar, te faz sorrir, te faz chorar, te faz viver. Te faz entender que o difícil da vida pode se transformar no insuportável. E esse temeroso insuportável chega fácil ao insustentável.
Não há muito o que fazer. O que foi feito já mudou a história. Às vezes, você só precisa de um filme realista e aflitivo como esse pra perceber que, na verdade, a vida não é assim tão bela… mais cedo ou mais tarde, todo mundo sente a selvageria dela.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.