“O Segredo de seus Olhos”
Comecei a ficar fã do ator argentino Ricardo Darín tardiamente. Talvez porque todo mundo o exaltava demais, e, por isso, me negava a conhecê-lo, a desbravar seus filmes, justamente por preguiça dessas modinhas. Mas ele está longe de ser apenas uma modinha. Agora, percebo que realmente tudo que ele se coloca a fazer é muito bom – pelo menos falo sobre tudo que já devorei com a participação dele até hoje. O último foi “O Segredo de seus Olhos”, do diretor Juan José Campanella – produção hermana que ganhou o Oscar de melhor filme estrangeiro em 2010, disponível na Netflix –, indicação da minha professora de espanhol, a atenciosa argentina Andrea Morini, que me reafirmou que o longa não seria apenas um filme romântico ou policial. E ele é muito mais do que isso… É algo que nenhum fã de cinema pode deixar de ver!
O roteiro conta a história de Benjamin Esposito (Darín), que se aposentou recentemente do cargo de oficial de Justiça, em 1999. Com bastante tempo livre, ele agora se dedica a escrever um livro. E, abusando de flashbacks (que eu amo!), o filme mostra que ele quer usar sua experiência para contar uma história trágica, da qual foi testemunha em 1974. Na época, ou seja, 25 anos antes, Esposito acompanhou a investigação sobre o estupro e a morte de uma bela jovem, o que o tocou bastante. É assim que ele conhece Ricardo Morales (Pablo Rago), marido da vítima, a quem promete ajudar a encontrar o culpado. Para tanto, ele conta com a ajuda de Pablo Sandoval (Guillermo Francella), seu grande amigo com problemas de alcoolismo, mas com enorme instinto apurativo, e de Irene Menéndez Hastings (Soledad Villamil), sua chefe imediata, por quem nutre uma paixão secreta. Paixão e investigação demonstradas em olhares. Às vezes, cegos, incisivos, avassaladores… de solidão, de compaixão… culpados, inocentes, mas sempre misteriosos, de indecisão. Olhos com sede de justiça, olhos com temor de amar, olhos carregados de emoção.
O que tinha tudo para ser um filme policial chato se transforma numa produção exemplar com roteiro complexo, com digressões constantes entre passado e presente; excelentes atuações dos atores, daquelas de deixar o frio na barriga ou os olhos marejados; uma fotografia belíssima, acompanhada da intensa trilha dos compositores Federico Jusid e Emilio Kauderer; e, especificamente, um plano-sequência de uma fuga de tirar o fôlego no estádio do Racing, bem no meio do filme, que, só de existir, já valeu o Oscar. Estou sendo exagerado, talvez, mas é só pra comprovar o alto nível de perfeição e adrenalina em forma de cena (há também uma tomada aérea nesse estádio que, oh… estão de parabéns!).
São esses olhares que me encantam. O diretor de fotografia, Félix Monti, e o de arte, Marcelo Pont Vergés, juntos com Campanella, fazem um trabalho tão bem-feito que exibem cenas lapidadas, primorosas de se ver. Com os olhares dos telespectadores aguçados pela maestria do trio, a atuação de todo o elenco, que usa e abusa das “miradas” para poder se expressar, é o exímio retrato daquele ditado que diz que alguns olhares falam mais do que mil palavras. “Você deveria ver os olhos dele. Estão em estado de ‘amor puro’”, diz Esposito. Ele indica apenas um personagem, mas o filme todo é rodeado desse amor em forma de visual.
Em um dos diálogos de Esposito com Irene, ele indaga: “Ontem pensei em algo que não me deixou dormir. Sabe quando alguém vê as coisas de um ângulo diferente, quando vê a outra pessoa, e isso faz você olhar a própria vida?”. Por mais que a gente torça para ele se abrir com ela, ele não faz isso. Ele prefere seguir com seu amor enclausurado, falando pelo olhar, o que o faz questionar: “Como se faz para viver uma vida vazia? Como se faz para viver uma vida cheia de nada?”. É assim a vida dele, às vezes a nossa também. Com olhares desocupados, desordenados, que faltam certo preenchimento.
Assim como a máquina de escrever de Esposito, que falta a letra “A”, nossos olhares costumam falhar. A tecla deve ser rebatida várias vezes para fixar a escrita em forma de imagem. E, para fugir daquela assustadora vida vazia, por vezes o olhar deve se ocultar e abrir lugar para o agir, para o falar, para que tudo faça valer e funcionar. Não deixar que os olhos te calem é a primeira lição do recomeçar. Eles têm que estar bem abertos, mas o segredo mesmo é se entregar e amar.
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