“O Estranho que Nós Amamos”
Sabe quando você começa a assistir a um filme e logo percebe: eu já vi isso antes. Não sei se foi quando vi “A Casa das Sete Mulheres”, minissérie da Globo de 2003, ou se foi em outro filme mesmo, mas este roteiro não me é estranho. Então, foi assim, com essa interminável dúvida, que assisti ao novo longa de Sofia Coppola, “O Estranho que Nós Amamos” – que está em cartaz nos cinemas e que, por sinal, foi aclamado no último Festival de Cannes, na França. Foi depois de alguns minutos de pesquisa na internet, durante a sessão mesmo, que entendi que a diretora adaptou o livro clássico de Thomas Cullinan e que a história já havia sido levada ao cinema em 1971, numa ótima produção dirigida por Don Siegel e estrelada por Clint Eastwood – o que nada impede que meu lado popularesco televisivo tenha falado mais alto e eu realmente tenha lembrado só da minissérie global mesmo.
Na trama, que se passa em 1864, três anos após o início da Guerra Civil Americana que partiu o país, um soldado ferido do Norte, John McBurney (Colin Farrell), encontra abrigo numa instituição para jovens mulheres sulistas, que sofrem durante o conflito. Ele foi ferido em combate e encontrado em um bosque pela jovem Amy (Oona Laurence). Ela o leva para a casa onde mora, o tal internato gerenciado por Martha Farnsworth (Nicole Kidman). Lá, elas decidem cuidar dele para que, após se recuperar, seja entregue às autoridades. Só que, aos poucos, cada uma delas demonstra interesses e desejos pelo homem, especialmente Edwina (Kirsten Dunst) e Alicia (Elle Fanning).
Só recapitulando: por causa da guerra, várias meninas internadas nessa instituição foram embora e deixaram apenas sete mulheres na casa. Como você pode ver, minha obsessão pela série da Globo tem algum cabimento, mas o enredo não tem nenhuma ligação com a história de amor “à la brasileira” de Thiago Fragoso e Mariana Ximenes na Revolução Farroupilha. Eu fiquei tão curioso, pesquisei mais e percebi que a história de Coppola é fiel à de 1971, mas bem mais contida. Eu não vi o primeiro longa e, por isso, li uma crítica na internet, que dizia: “A versão com Clint Eastwood esbarra no gênero erótico, tamanha a sexualização da trama. A produção de 2017 parece a edição com cortes, por comparação”.
Ora, se o filme atual é mais recatado – em que temas mais polêmicos são evitados, como escravidão, relacionamentos impróprios com menores e qualquer teor sexual mais explícito –, podemos encontrar a essência do roteiro respeitada e bem mais requintada. Seria um politicamente correto com mais sofisticação. A direção é impecável, e o filme parece uma pintura: é belíssimo esteticamente, criando verdadeiras telas em movimento em tom sépia.
E tem mais: o clima de tensão cresce a cada cena. A presença do soldado, de caráter duvidoso e que pode ser visto como um inimigo à espreita no início do filme, causa inquietação e ansiedade tanto para elas, quanto para nós, espectadores. Tanto que ele fica preso, como um animal, mas depois vai conquistando as anfitriãs e se tornando uma figura cativante, encantadora, que pode preencher uma vazia lacuna na vida delas.
Só que, em certo momento do filme, quando a aflição acaba, surge uma reviravolta que, pra mim, faz com que a produção se perca. Não sei se no longa de 1971 acontece o mesmo, mas, se isso tiver acontecido, vai ter forçado um suspensão desnecessário, uma expectativa dispensável que, no meu ponto de vista, é só uma maneira medonha, bem cruel e mórbida para finalizar o roteiro.
Eu acho que vou ter que assistir ao original. Já que a ideia é abordar questões como o desejo e a culpa, por que, nessa altura do campeonato, ser mais moderado e habitual? Quem sabe com um teor mais sexual a trama ficaria mais conceitual.
Até a próxima,
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